quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Rainha Nzinga Mbandi


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Filha de Nzinga a Mbande Ngola Kiluaje e Guenguela Cakombe Controversa líder feminina homenageada em Angola e no Brasil. Misto de libertadora com uma grande negociadora de escravos. Inteligente e cruel ao mesmo tempo. É difícil fazer um julgamento de seu caráter a tanta distancia cronológica.
A Historia de Nzinga começa com a ocupação portuguesa, em 1578, quando Paulo Dias de Novais funda a cidade fortificada de São Paulo de Assumpção de Luanda que se tornará a futura capital de Angola em território mbundu. O rei dos mbundu era Ngola Kiluanji, pai de Nzinga, resistiu por muitos anos à invasão de seu território. Ngola Kiluanji resiste à ocupação portuguesa. No entanto, uma parte do território é tomada, constituindo o primeiro espaço colonial na região. O rei Kiluanji refugia-se em Cabassa, no interior de Matamba, e consegue reter o avanço dos portugueses. Após a morte de Kiluanji sucede seu filho Kia Ngola Mbandi, meio irmão de Nzinga, que, inicialmente, também impediu o avanço do comércio escravagista para o interior. Uma das primeiras medidas de Kia Mbamdi foi matar o filho único de Nzinga, concorrente em potencial.
Ela também teve de aturar forte oposição interna por ser mulher e ter como mãe uma escrava – mancha grave em sua ficha, já que todo o poder, no reino, se baseava nas relações de parentesco. Nzinga fora criada pelo pai, o rei Jinga Mbandi, para ser uma rainha guerreira. Diplomata hábil, auxiliou seu irmão, mesmo rancorosa com o ato de assassinato de seu filho, negociando a devolução de territórios já ocupados pelos invasores. Recebida em Luanda com grande pompa pelo governador geral ela negocia sem ceder algum território e pede a devolução de territórios que obtém pela sua conversão política ao cristianismo, recebendo o nome de Dona Anna de Sousa. Mais tarde suas irmãs Cambi e Fungi também se convertem, passando a se chamar Dona Bárbara e Dona Garcia respectivamente.
Entretanto os portugueses ficam impacientes, e no desejo de estabelecerem o comércio com o jaga de Cassanje no interior, não respeitam o tratado de paz. A rebelião de alguns sobas (chefes), que se aliam ao jaga de Cassange e aos portugueses, cria uma situação de desordem no reino de Ngola.
Depois de saber da quebra do tratado, ela perguntou ao seu irmão para interceder e lutar contra a invasão portuguesa. Nzinga assume o comando da situação e ao encontrar um dos sobas, seu tio, que se dirigia a Luanda para se submeter aos portugueses, manda decapitá-lo, e dando conta da hesitação de seu irmão manda envenená-lo abrindo assim caminho ao poder e ao comando da resistência à ocupação das terras de Ngola e Matamba.
De volta da sua missão, faz sua vingança, reorganizando seu exercito, mas esperando o momento propício. Aclamada Rainha Nzinga vai atirar o sobrinho, recebendo-o alegremente para em seguida apunhalá-lo, deste modo acaba sua vingança. Os adversários portugueses respondem elegendo um chefe mbundu, Aiidi Kiluanji (Kiluanji II), como novo Ngola das terras do Ndongo.
A líder Nzinga, não conseguindo um acordo de paz com os portugueses em troca de seu reconhecimento como rainha de Matamba, renega a fé católica e se alia aos guerreiros jagas de Oeste se fazendo iniciar nos ritos da máquina de guerra que constituía o quilombo. Ele une-se a eles casando com um chefe jaga.

Aliou-se a guerreiros jagas passando a atuar em quilombos, com espaços e táticas de guerra semelhantes aos utilizados por seu contemporâneo Zumbi dos Palmares em terras brasileiras. Durante a guerra por liderar pessoalmente as suas tropas e proibiu de as suas tropas a tratarem de "Rainha", preferindo que se dirigissem a ela como "Rei". Em 1640, a rainha Nzinga e seus guerreiros atacam o forte Massangano, onde suas duas irmãs, Cambu e Fungi, são aprisionadas, sendo esta última executada. Aproveitando a ocupação temporária de Luanda pelos holandeses, recupera alguns territórios de Ngola com a adesão de alguns sobas (chefes). Salvador Correia de Sá y Benevides, general brasileiro, restaura a soberania portuguesa em Luanda e tenta restabelecer seu poder no interior.
Numa incursão do exército de Nzinga são aprisionados dois capuchinhos que a rainha aproveita para convencê-los de sua vontade de reconversão em troca do reconhecimento de sua soberania nos reinos de Ngola e Matamba e da libertação de sua irmã Cambu. O governador geral aceita libertar Cambu se Nzinga retificar um tratado limitando suas reivindicações a Matamba e renunciando aos territórios de Ngola, sendo o rio Lucala escolhido como fronteira.
Este tratado, de 1656, só vai ser posto em prática depois da ameaça da rainha voltar à guerra. Só assim o governo de Luanda libera sua irmã Cambu, mesmo assim depois do pagamento de um resgate de mais de uma centena de escravos. Cambu tinha ficado retida em Luanda por cerca de dez anos.
Há uma paz relativa no reino de Matamba até a sua morte aos 82 anos em 17 de dezembro de 1663. Sucede a Nzinga sua irmã Cambu, continuadora da memória de sua irmã, a rainha quilombola de Matamba e Angola.
Um episódio revela bem essas qualidades: Quando se apresenta como embaixatriz em Luanda, o governador recebe-a numa sala onde havia apenas uma cadeira e uma almofada o governador oferece-lhe a almofada, o que Nzinga recusa por ofender a sua dignidade real e senta-se no corpo ajoelhado de um dos acompanhantes da sua corte, eliminando a posição de inferioridade que sutilmente lhe era oferecida pelo governador. Quando a audiência foi terminada deixa a escrava na mesma posição. Perguntaram-lhe se esquecera a escrava, ela respondeu, que não costumava conduzir a cadeira utilizada em cerimônia de tal importância.
Despertou o interesse dos iluministas como a criação de um romance inspirado nos seus feitos (Castilhon, 1769) e citação na Histoire Universelle (1765)Obteve vitórias e uma relativa paz até morrer aos 82 anos de idade.
Dr. Carlos H. M. Serrano*
*CARLOS M. H. SERRANO, Nascido em Cabinda - Angola, é Professor de Antropologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. É vice-diretor do Centro de Estudos Africanos da USP, Autor dos livros "Os Senhores da Terra e os Homens do Mar"; "A Revolta dos Colonizados" (paradidático, com o prof. Kabengele Munanga); "Brava Gente do Timor" (com o prof. Maurício Waldman); e "Angola: Nasce Uma Nação"...
À memória de Beatriz do Nascimento, estudiosa dos quilombos e quilombola também.
BIBLIOGRAFIA
BALANDIER, Georges. Antropologia Política. São Paulo, Difusão Européia do Livro, 1969.
BIRMINGHAM, David. A Conquista Portuguesa de Angola. Lisboa, A Regra de Jogo, 1974.
CASTILHON, J.-L. Zingha, Reine D'Angola. Histoire Africaine. Bourges, Ganymede, 1993.
CAVAZZI, Pe. João Antonio (de Montecúccolo). Descrição Histórica dosTrês Reinos Congo, Matamba e Angola (1687). Lisboa, Edição da Junta de Investigações do Ultramar, 1965, 2 volumes.
MILLER, Joseph C. "Nzinga of Matamba in a New Perspective", in Journal of African History, XVI 2 (1975), pp. 201-16.
---. Kings and Kinsmen, Early Mbundu States in Angola. Oxford, Clarendon Press,1976.
SERRANO, Carlos. "História e Antropologia na Pesquisa do mesmo Espaço: a Afro-América", in África: Revista do Centro de Estudos Africanos da USP, 5, 1982, pp. 124-8.
---. Os Senhores da Terra e os Homens do Mar: Antropologia Política de um Reino Africano. FFLCH-USP, 1983.
SOROMENHO, Castro. "Portrait: Jinga, Reine de Ngola et de Matamba", in Presence Africaine, 3e. trimestre 1962, pp. 47-53.
** Artigo originalmente publicado na Revista da USP, nº 28 ( Dossiê do Povo Negro )
- Fonte: Cartilha “Mulher Negra tem História” -
Alzira Rufino, Nilza Iraci, Maria Rosa Pereira, 1987, Santos;
Roy Glasgow - "Nzinga"- ed. Perspectiva, Col. Debates - 1982 - SP

5 comentários:

Xico Rocha disse...

Valeu pela informação, parabéns pelo blog.
Xico Rocha

Anônimo disse...

um importantisimo trabalho para a preservacao e divugacao da Historia Negra em geral e ango-brasileira em particular.Os factos estam em concordancia com outras fontes historicas.

Anônimo disse...

valeu as informações!!!pra mim tem sido de grande utilidade para meu trabalho.

Yêda Maria disse...

Essas informações são muito relevantes, precisamos sim de iniciativas como a sua de divulgar a histórias de luta e resitência dos nossos ancestrais africanos.

Anônimo disse...

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